segunda-feira, novembro 24, 2008

Mario Quintana e as grandes questões: A que mundo pertenço? Quem urde eternamente a trama de tão velhos sonhos? Quem faz - em mim - esta interrogação?


Olho as minhas mãos


Olho as minhas mãos: elas só não são estranhas
Porque são minhas. Mas é tão esquisito distendê-las
Assim, lentamente, como essas anêmonas do fundo do mar...
Fechá-las, de repente,
Os dedos como pétalas carnívoras !
Só apanho, porém, com elas, esse alimento impalpável do tempo,
Que me sustenta, e mata, e que vai secretando o pensamento
Como tecem as teias as aranhas.
A que mundo
Pertenço ?
No mundo há pedras, baobás, panteras,
Águas cantarolantes, o vento ventando
E no alto as nuvens improvisando sem cessar.
Mas nada, disso tudo, diz: "existo".
Porque apenas existem...
Enquanto isto,
O tempo engendra a morte, e a morte gera os deuses
E, cheios de esperança e medo,
Oficiamos rituais, inventamos
Palavras mágicas,
Fazemos
Poemas, pobres poemas
Que o vento
Mistura, confunde e dispersa no ar...
Nem na estrela do céu nem na estrela do mar
Foi este o fim da Criação !
Mas, então,
Quem urde eternamente a trama de tão velhos sonhos ?
Quem faz - em mim - esta interrogação ?

Mario Quintana
(1906-1994)

Mais sobre Mario Quintana em
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_Quintana

2 comentários:

Anônimo disse...

Fantástico, esse blog! Parece uma caixinha de surpresas, cheinha de pérolas de brilhos variados. Meus parabéns!

G.H. disse...

Esse blog é joia rara!