quinta-feira, novembro 13, 2008

Álvaro de Campos traz um grande cansaço de ser tanta coisa, de esperar, de sentir, de ser. Para ele vale a pena sentir para ao menos deixar de sentir.


Vai pelo cais fora um bulício de chegada próxima


Vai pelo cais fora um bulício de chegada próxima,
Começam chegando os primitivos da espera,
Já ao longe o paquete de África se avoluma e esclarece.

Vim aqui para não esperar ninguém,
Para ver os outros esperar,
Para ser os outros todos a esperar,
Para ser a esperança de todos os outros.

Trago um grande cansaço de ser tanta coisa.
Chegam os retardatários do princípio,
E de repente impaciento-me de esperar, de existir, de ser,
Vou-me embora brusco e notável ao porteiro que me fita muito
mais rapidamente.

Regresso à cidade como à liberdade.

Vale a pena sentir para ao menos deixar de sentir.

Álvaro de Campos, um dos heterônimos de

Fernando Pessoa
(1888-1935)

Mais sobre Fernando Pessoa em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa

2 comentários:

Anna K. Lacerda disse...

As vezes não cabemos em nós, e nessa hora, só sabemos correr para o espelho.

Anna K. Lacerda disse...

As vezes não cabemos em nós, e nessa hora, só sabemos correr para o espelho.