segunda-feira, novembro 03, 2008
Chegaste, noite minha, ó noite mais pequena do que a morte. Nas mãos abertas onde me fechaste, ponho os meus versos e a própria sorte, canta Eugénio.
Noite transfigurada
Criança adormecida, ó minha noite,
noite perfeita e embalada
folha a folha,
noite transfigurada,
ó noite mais pequena do que as fontes,
pura alucinação da madrugada
- chegaste,
nem eu sei de que horizontes.
Hoje vens ao meu encontro
nimbada de astros,
alta e despida
de soluços e lágrimas e gritos
- ó minha noite, namorada
de vagabundos e aflitos.
Chegaste, noite minha,
de pálpebras descidas;
leve no ar que respiramos
nítida no ângulo das esquinas
- ó noite mais pequena do que a morte:
nas mãos abertas onde me fechaste
ponho os meus versos e a própria sorte.
Eugénio de Andrade
(1923-2005)
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