quinta-feira, agosto 28, 2008

Para Cora Coralina, não são os filhos que nos devem, são os pais que devem a eles.E explica tudo em versos, até a ameaça terrível da maldição da mãe.


Pai e filho


Não são os filhos que nos devem. São os pais que devem a eles.
Estatuto do passado. Resquício do Pater Familias
do Direito Romano - O Pai tem todos os direitos
e o filho, todos os deveres.
Assim era, assim foi.
Hoje, sem precisar leis, nem decretos, nem códigos, pela força
da evolução humana, através de séculos, vencendo resistências,
ab-rogando artigos e parágrafos, se fez o inverso.
O Pai tem todos os deveres e o filho todos os direitos.
Princípio de justiça incontestado pelos próprios pais
e juízes destes tempos novos.

Nego o amor dos pais dos passados, salvante exceções.
O que eles sentiam era o orgulho da posse, o domínio sobre sua descendência.
Tudo, todos, judiciários e adultos. Sua hermenêutica
sutil de leis, interpretação, a favor dos adultos.
Os adultos, pai ou mãe, levavam sempre o melhor. Aí estão os inventários
antigos. Os velhos autos comprovando interesses mesquinhos, fraudes,
despojando filhos menores, indefesos, de bens a eles devidos.
Na casa antiga, castigos corporais e humilhantes, coerção,
atitudes impostas, ascendência férrea, obediência cega.
Filhos foram impiedosamente sacrificados e despojados.
E para alguma rebeldia indomável, lá vinha a ameaça terrível, impressionante
da maldição da mãe, a que poucos resistiam.
Do resto prefiro não esmiuçar.

Cora Coralina
(1889-1985)

Mais sobre Cora Coralina em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Cora_Coralina

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