domingo, outubro 18, 2009

Na dúvida cruel, Castro Alves quer saber: pelas sombras temerosas, onde vai esta canoa? Vai tripulada ou perdida, vai ao certo ou à toa?


A canoa fantástica


Pelas sombras temerosas
Onde vai esta canoa?
Vai tripulada ou perdida?
Vai ao certo ou vai à toa?
Semelha um tronco gigante
De palmeira, que s'escoa...
No dorso da correnteza,
Como bóia esta canoa!...
Mas não branqueja-lhe a vela!
N'água o remo não ressoa!
Serão fantasmas que descem
Na solitária canoa?
Que vulto é este sombrio
Gelado, imóvel, na proa?
Dir-se-ia o gênio das sombras
Do inferno sobre a canoa!...
Foi visão? Pobre criança!
À luz, que dos astros coa,
É teu, Maria, o cadáver,
Que desce nesta canoa?
Caída, pálida, branca!...
Não há quem dela se doa?!...
Vão-lhe os cabelos a rastos
Pela esteira da canoa!...
E as flores róseas dos golfos,
— Pobres flores da lagoa,
Enrolam-se em seus cabelos
E vão seguindo a canoa!...

Castro Alves
(1847-1871)

Mais sobre Castro Alves em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Castro_Alves

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