sexta-feira, outubro 30, 2009

Em versos, Cecília Meireles nos mostra como é triste ver-se o homem por dentro. A alma, não.


Anatomia


É triste ver-se o homem por dentro:
tudo arrumado, cerrado, dobrado
como objetos num armário.

A alma, não.

É triste ver-se o mapa das veias,
e esse pequeno mar que faz trabalhar seus rios
como por obscuras aldeias
indo e vindo, a carregar vida, estranhos escravos.

Mas a alma?

É triste ver-se a elétrica floresta
dos nervos: para estrelas de olhos e lágrimas,
para a inquieta brisa da voz,
para esses ninhos contorcidos do pensamento.

E a alma?

É triste ver-se que de repente se imoboliza
esse sistema de enigmas,
de inexplicado exercício,
antes de termos encontrado a alma.

Pela alma choramos.
Procuramos a alma.
Queríamos alma.

Cecília Meireles
(1901-1964)

Mais sobre Cecília Meirels em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Cec%C3%ADlia_Meireles

Um comentário:

Lazim disse...

Muito boa a Escolha! Esse poema é maravilhos!