segunda-feira, janeiro 05, 2009

Mauro Mota sofre quando o leiloeiro grita: Quem dá mais? E bate o martelo, bate aqui, dói longe, diz ele em seus versos de tristeza.


Leilão


- Quanto dão? Quanto dão?
- Quem dá mais?, grita mais o leiloeiro.
- Esta bengala de castão de ouro!
(Onde anda sem levá-la o dono antigo?)
- Esta arca colonial!
(Falam dedicatórias de retratos,
falam cartas de amor, a voz trancada.)
- Esta mobília de jacarandá!
(As visitas na sala, o pai, a mãe,
a irmã, a avó cochila no sofá.)
- Este faqueiro de prata!
(Cruzados os talheres, as mãos cruzadas.)
- Esta cômoda do século XIX!
(Soluçam as gavetas; dentro delas,
cheiro de roupa branca e de alecrim.)
- Esta louça azul de Macau!
(A fumaça (da sopa?) na terrina.
Na borda (asa quebrada) desta xícara
os vestígios dos lábios da menina.)
Quem tira as rosas que a moça bota
nos jarros de opaline do consolo?
E a moça presa dentro deste espelho
do toucador do quarto de dormir?
- Quem dá mais? grita mais o leiloeiro.
Bate o martelo, bate aqui, dói longe.”

Mauro Mota
(1911-1984)

Mais sobre Mauro Mota em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mauro_Mota

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