domingo, janeiro 11, 2009

Ela passa em frente aos olhos de Mário de Sá-Carneiro, toda negra de crepes lutuosos. Ele diz que nunca foi poeta, mas começa a meditar uns versos.


Simplesmente...


Em frente dos meus olhos, ela passa
Toda negra de crepes lutuosos
Os seus passos são leves, vigorosos;
No seu perfil há distinção, há raça.

Paris. Inverno e sol. Tarde gentil.
Crianças chilreantes deslizando...
Eu perco o meu olhar de quando em quando,
Olhando o azul, sorvendo o ar de abril.

...Agora sigo a sua silhueta
Até desapar'cer no boulevard,
E eu que não sou nem nunca fui poeta,
Estes versos começo a meditar.

Perfil perdido...Imaginariamente,
Vou conhecendo a sua vida inteira.
Sei que é honesta, sã, trabalhadeira,
E que o pai lhe morreu recentemente.

(Ah! como nesse instante a invejei,
Olhando a minha vida deplorável -
A ela, que era enérgica e prestável,
Eu, que até hoje nunca trabalhei!...)

A dor foi muito, muito grande. Entanto
Ela e a mãe souberam resistir.

Mário de Sá-Carneiro
(1890-1916)

Mais sobre Mário de Sá-Carneiro em
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_de_S%C3%A1-Carneiro

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