quinta-feira, agosto 20, 2009

Vem, doce morte, quando queiras. Tenho o corpo tão leve que a teu primeiro sopro cederei distraída, diz em versos Henriqueta Lisboa.


Vem, doce morte


Vem, doce morte. Quando queiras.
Ao crepúsculo, no instante em que as nuvens
desfilam pálidos casulos
e o suspiro das árvores - secreto -
não é senão prenúncio
de um delicado acontecimento.

Quanto queiras. Ao meio-dia, súbito
espetáculo deslumbrante e inédito
de rubros panoramas abertos
ao sol, ao mar, aos montes, às planícies
com celeiros refertos e intocados.

Quando queiras. Presentes as estrelas
ou já esquivas, na madrugada
com pássaros despertos, à hora
em que os campos recolhem as sementes
e os cristais endurecem de frio.

Tenho o corpo tão leve (quando queiras)
que a teu primeiro sopro cederei distraída
como um pensamento cortado
pela visão da lua
em que acaso - mais alto - refloresça.

Henriqueta Lisboa
(1901-1985)

Mais sobre Henriqueta Lisboa em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Henriqueta_Lisboa

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