quarta-feira, agosto 12, 2009
Toda a tristeza de Guilherme de Almeida balança e dança na noite. E no papel em que escreve, em vez do seu amor, ficam apenas uns versos sem nervos.
Big city blues
Noite. Tédio. Vitrola.
Do disco negro uma espiral se desenrola
e estica-se no céu. E nessa corda tesa
toda a minha tristeza
balança
e dança...
E, nem sei bem por que,
eu começo a escrever para você:
- "Como eu penso em você nessa noite de insônia!
"Lá em baixo, alva de lua, a cidade ressona:
"a cidade que foi minha cidade...
"Foi. Não é mais. Agora é uma pobre saudade,
"uma saudade longa de mim mesmo,
"de você, de nós dois, de tudo o que vivemos
"por essas ruas tristes, paralelas,
"que não se encontram mais...(Não serão elas
"como nós dois, agora?...).
"Como eu me lembro, amor! Desde aquela hora
"em que os seus olhos pálidos roçaram
"pelos meus; e os meus olhos se fecharam
"um pouco, como para
"reter aquela mocidade clara
"que passava por eles, como passa,
"cheia de graça,
"a mocidade ao longo de uma vida..."
Mas minha mão parou. Da pena adormecida
ficaram, no papel inerte em que eu escrevo,
em vez do meu amor, estes versos sem nervos...
Meus "diabinhos azuis",
meus pobres big city blues...
Guilherme de Almeida
(1890-1969)
Mais sobre Guilherme de Almeida em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Guilherme_de_Almeida
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