sexta-feira, junho 12, 2009
Guimarães Rosa conhece como ninguém as águas da serra. Águas que correm, claras, do escuro dos morros, cantando nas pedras a canção do mais-adiante.
Águas da Serra
Águas que correm,
claras,
do escuro dos morros,
cantando nas pedras a canção do mais-adiante,
vivendo no lodo a verdade do sempre-descendo...
Águas soltas entre os dedos da montanha,
noite e dia,
na fluência eterna do ímpeto da vida...
Qual terá sido a hora da vossa fuga,
quando as formas e as vidas se desprenderam
das mãos de Deus,
talvez enquanto o próprio Deus dormia?...
E então, do semi-sono dos paraísos perfeitos,
os diques se romperam,
forças livres rolaram,
e veio a ânsia que redobra ao se fartar,
e os pensamentos que ninguém pode deter,
e novos amores em buscas de caminhos,
e as águas e as lágrimas sempre correndo,
e Deus talvez ainda dormindo,
e a lua a avançar, sempre mais longe,
nos milênios de treva do sem-fim...
Guimarães Rosa
(1908-1967)
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