quarta-feira, março 05, 2008

Na ânsia de ter alguma coisa e nada tendo, Mário de Sá-Carneiro decide-se a criar. E escava a fundo: onde existo que não existo em mim?


Escavação


Numa ânsia de ter alguma coisa,
Divago por mim mesmo a procurar,
Desço-me todo, em vão, sem nada achar;
E a minh'alma perdida não repousa.

Nada tendo, decido-me a criar:
Brando a espada: sou luz harmoniosa
E chama genial que tudo ousa
Unicamente à força de sonhar...

Mas a vitória fulva esvai-se logo...
E cinzas, cinzas só, em vez de fogo...
- Onde existo que não existo em mim?

Um cemitério falso sem ossadas,
Noites d'amor sem bocas esmagadas -
Tudo outro espasmo que princípio ou fim....

Mário de Sá-Carneiro
(1890-1916)

Mais sobre Mário de Sá-Carneiro em
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_de_S%C3%A1-Carneiro

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