quarta-feira, abril 22, 2009
Que vale a natureza sem teus Olhos, ó Aquela por quem meu Sangue pulsa? Ó meu amor, por que te ligo à morte? Para ela, perguntas de Ariano Suassuna.
Noturno
Tem para mim Chamados de outro mundo
as Noites perigosas e queimadas,
quando a Lua aparece mais vermelha.
São turvos sonhos, Mágoas proibidas,
são Ouropéis antigos e fantasmas
que, nesse Mundo vivo e mais ardente
consumam tudo o que desejo Aqui.
Será que mais Alguém vê e escuta?
Sinto o roçar das asas Amarelas
e escuto essas Canções encantatórias
que tento, em vão, em mim desapossar.
Diluídos na velha Luz da lua,
a Quem dirigem seus terríveis cantos?
Pressinto um murmuroso esvoejar:
passaram-me por cima da cabeça
e, como um Halo escuso, te envolveram.
Eis-te no fogo, como um Fruto ardente,
a ventania me agitando em torno
esse cheiro que sai de teus cabelos.
Que vale a natureza sem teus Olhos,
ó Aquela por quem meu Sangue pulsa?
Da terra sai um cheiro bom de vida
e nossos pés a Ela estão ligados.
Deixa que teu cabelo, solto ao vento,
abrase fundamente as minhas mãos...
Mas não: a luz Escura inda te envolve,
o vento encrespa as Àguas dos dois rios
e continua a ronda, o Som do fogo.
Ó meu amor, por que te ligo à Morte?
Ariano Suassuna
(1927)
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