quarta-feira, novembro 18, 2009

Mário Faustino sente que o mês presente o assassina. E que há panos de imprimir a dura face à força de suor, sangue e chaga.


Sinto que o mês presente me assassina


Sinto que o mês presente me assassina,
As aves atuais nasceram mudas
E o tempo na verdade tem domínio
Sobre homens nus ao sul das luas curvas.
Sinto que o mês presente me assassina,
Corro despido atrás de um cristo preso,
Cavalheiro gentil que me abomina
E atrai-me ao despudor da luz esquerda
Ao beco de agonia onde me espreita
A morte espiritual que me ilumina.
E o temporal ladrão rouba-me as fêmeas
De apóstolos marujos que me arrastam
Ao longo da corrente onde blásfemas
Gaivotas provam peixes de milagre.
Sinto que o mês presente me assassina,
Há luto nas rosáceas desta aurora,
Há sinos de ironia em cada hora
(Na libra escorpiões pesam-me a sina)
Há panos de imprimir a dura face
À força de suor, sangue e chaga.

Mário Faustino
(1930-1962)

Mais sobre Mário Faustino em
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_Faustino

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