sábado, fevereiro 20, 2010

Na espera angustiante, Guilherme de Almeida continua a sua pobre prece: Que seria de mim se ela não viesse? E que será quando ela vier, meu Deus?


A espera


Vem... Não vem... - Olho a rua: é outono. E o outono
tem um grande prestígio emocional:
vem todo cheio de alma e de abandono
e entra em meus nervos lânguidos de sono,
como a ponta excitante de um punhal!

Vem... Não vem... - Na paisagem amarela
da rua doente há um contagioso spleen.
Fica auscultando o vidro da janela:
passa um vento nervoso - e eu penso nela;
voa uma folha morta - e eu penso em mim.

Vem... Não vem... - Cada voz perdida, ou cada
figurinha ligeira de estação
toda afogada em peles, na calçada,
ou cada passo nos degraus da escada
marca o compasso do meu coração.

Vem...não vem... - E esta frase ingênua esvoaça
no ar, desfolhada como um malmequer.
Tamborilando os dedos na vidraça,
eu conto um verso - e no meu verso passa
timidamente um nome de mulher.

Vem... Não vem... Vem... Não vem... - A tarde desce
a mão cansada de dizer adeus...
E eu continuo a minha pobre prece:
- Que seria de mim, se ela não viesse?
E que será quando ela vier, meu Deus?

Guilherme de Almeida
(1890-1969)

Mais sobre Guilherme de Almeida em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Guilherme_de_Almeida

Um comentário:

Anônimo disse...

MAravilhosa!!!! Possuo a obra completa desse magnífico poeta. Posso garantir que é o melhor de todos que já conhecí.