quinta-feira, dezembro 04, 2008

Mario Quintana nos mostra que um poema sobre uma pequena crônica policial pode ser também uma obra-prima. E provocar lágrimas de emoção.


Pequena crônica policial


Jazia no chão, sem vida,
E estava toda pintada!
Nem a morte lhe emprestara
A sua grande beleza...
Com fria curiosidade,
Vinha gente a espiar-lhe a cara,
As fundas marcas da idade,
Das canseiras, da bebida...

Triste da mulher perdida
Que um marinheiro esfaqueara!
Vieram uns homens de branco,
Foi levada ao necrotério.
E quando abriram, na mesa,
O seu corpo sem mistério,
Que linda e alegre menina
Entrou correndo no céu?!
Lá continuou como era
Antes que o mundo lhe desse
A sua maldta sina:
Sem nada saber da vida,
De vícios ou de perigos,
Sem nada saber de nada...
Com a sua trança comprida,
Os seus sonhos de menina,
Os seus sapatos antigos!

Mario Quintana
(1906-1994)

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