terça-feira, abril 03, 2007

Naqueles dias de terror e escuridão, Gullar chegou a dizer adeus à ilusão, mas não ao mundo. Mas não à vida, e foi construir um poema, uma bandeira.


Agosto 1964


Entre lojas de flores e de sapatos, bares,
mercados, butiques,
viajo
num ônibus Estrada de Ferro - Leblon.
Volto do trabalho, a noite em meio,
fatigado de mentiras.

O ônibus sacoleja. Adeus, Rimbaud,
relógio de lilases, concretismo,
neoconcretismo, ficções da juventude, adeus,
que a vida
eu a compro à vista aos donos do mundo.
Ao peso dos impostos, o verso sufoca,
a poesia responde a inquérito policial-militar.

Digo adeus à ilusão
mas não ao mundo. Mas não à vida,
meu reduto e meu reino.
Do salário injusto,
da punição injusta,
da humilhação, da tortura,
do terror,
retiramos algo e com ele construímos um artefato

um poema
uma bandeira


Ferreira Gullar

Mais sobre Ferreira Gullar em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ferreira_Gullar

2 comentários:

porvidacarclub disse...

retiramos algo e com ele (constrímos) um artefato


*retiramos algo e com ele (construímos) um artefato

O Editor disse...

Muito obrigado pela correção de nossa falha de digitação. É de coloborações como a sua que precisamos para manter o nível de qualidade do Poemblog.
Obrigado, mais uma vez,
O Editor