O resgate
A última ilusão foi partir os espelhos -
E nas salas ducais, os frisos de esculturas
Desfizeram-se em pó...Todas as bordaduras
Caíram de repente aos reposteiros velhos.
Atônito, parei na grande escadaria
Olhando as destroçadas, imperiais riquezas...
Dos lustres de cristal - as velas d'ouro, acesas,
Quebravam-se também sobre a tapeçaria...
Rasgavam-se cetins, abatiam-se escudos,
Estalavam de cor os grifos dos ornatos.
Pelas molduras d'honra, os lendários retratos
Sumiam-se de medo, a roçagar veludos...
Doido! Trazer ali os meus desdéns crispados!
Tectos e frescos, pouco a pouco, enegreciam;
Panos de Arrás do que não-Fui emurcheciam -
Velavam-se os brasões, subitamente errados...
Então, eu mesmo fui trancar todas as portas;
Fechei-me a Bronze eterno em meus salões ruídos...
- Se arranho o meu despeito entre vidros partidos,
Estilizei em Mim as douraduras mortas!
Mário de Sá Carneiro
(1890-1916)
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