sábado, novembro 12, 2011

Adélia Prado não queria palavras para rezar. Para ela, bastava ser um quadro bem na frente de Deus pra Ele olhar.


A pintora

Hoje de tarde
pus uma cadeira no sol pra chupar tangerinas
e comecei a chorar,
até me lembrar de que podia
falar sem mediação com o próprio Deus
daquela coisa vermelho-sangue, roxo-frio, cinza.
Me agarrei aos seus pés:
Vós sabeis, Vós sabeis,
só Vós sabeis, só Vós.
O bagaço da laranja, suas sementes
me olhavam da casca em concha
na mão seca.
Não queria palavras pra rezar,
bastava-me ser um quadro
bem na frente de Deus
pra Ele olhar.

Adélia Prado
(1935)

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