quinta-feira, setembro 09, 2010

Se o mundo dura tanto e eu tão pouco, importa pouco se ele não for eterno.É o que diz em versos Ferreira Gullar sobre a relativa eternidade.



A relativa eternidade

Cruzo a rua e vejo
sobre a montanha
que se ergue no horizonte
para além da Lagoa
nuvens matinais
iluminadas
contra um céu muito azul

como na primeira manhã do mundo

(ainda que
em todos os dias do ano
quando faz sol
essa festa matinal se tenha repetido
por séculos)

mas pouco importa:
é hoje manhã pela primeira vez

ainda que
antes de terem aqui chegado os portugueses
já ali estivessem a montanha
o céu azul
e as nuvens a se esgarçarem

quer houvesse
ou não
(como agora)
alguém para vê-los

e então me digo:
se o mundo dura tanto
e eu tão pouco
importa pouco
se ele não for eterno

Ferreira Gullar

Mais sobre Ferreira Gullar em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Ferreira_Gullar







Um comentário:

Nem Queiroz disse...

Entendo o poeta quanto a tristeza da brevidade da vida humana, mas acho também que ele peca por egoísmo e despeito para com a vida alheia. Ele é amargo aqui, quando dá de ombros com a eternidade magnífica da vida total. Somos o que somos, e o mundo deve continuar sim, para além de mim, para além de nós!

Nem Queiroz