segunda-feira, janeiro 07, 2013

Só de ouro falso os meus olhos se douram, sou esfinge sem mistério no poente. Sou templo prestes a ruir sem deus, estátua falsa ainda erguida no ar, no sentimento de Mário de Sá-Carneiro.


Estátua falsa

Só de ouro falso os meus olhos se douram;
Sou esfinge sem mistério no poente.
A tristeza das coisas que não foram
Na minha'alma desceu veladamente.
Na minha dôr quebram-se espadas de ânsia,
Gomos de luz em treva se misturam.
As sombras que eu dimano não perduram,
Como Ontem, para mim,
Hoje é distancia.
Já não estremeço em face do segredo;
Nada me aloira já, nada me aterra:
A vida corre sobre mim em guerra,
E nem sequer um arrepio de medo!
Sou estrela ébria que perdeu os céus,
Sereia louca que deixou o mar;
Sou templo prestes a ruir sem deus,
Estátua falsa ainda erguida ao ar...

Mário de Sá-Carneiro

(1890-1916)

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