quarta-feira, janeiro 16, 2013
Guilherme de Almeida sente no perfume da flor de asfalto qualquer coisa que lembra folhas mortas. E também a vida singular de São Paulo, sua cidade.
Flor de asfalto
Trazes nos olhos a melancolia
das longas perspectivas paralelas,
das avenidas outonais, daquelas
ruas cheias de folhas amarelas
sob um silêncio de tapeçaria...
Em tua voz nervosa tumultua
essa voz de folhagens desbotadas,
quando choram ao longo das calçadas,
simétricas, iguais e abandonadas,
as árvores tristíssimas da rua!
Flor da cidade, em teu perfume existe
Qualquer coisa que lembra folhas mortas,
sombras de pôr de sol, árvores tortas,
pela rua calada em que recortas
tua silhueta extravagante e triste...
Flor de volúpia, flor de mocidade,
teu vulto, penetrante como um cume,
passa e, passando, como que resume
no olhar, na voz, no gesto e no perfume,
a vida singular desta cidade.
Guilherme de Almeida
(1890-1969)
Mais sobre Guilherme de Almeida em
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