terça-feira, abril 03, 2012

Mário de Andrade bem sabe que tudo é engano, mas sabendo disso persiste em se enganar. Ele quer amar a morte com o mesmo engano com que amou a vida.


Quarenta anos


A vida é para mim, esté se vendo,
Uma felicidade sem repouso;
Eu nem sei mais se gozo, pois que o gozo
Só pode ser medido em se sofrendo.
Bem sei que tudo é engano, mas sabendo
Disso, persisto em me enganar...Eu ouso
Dizer que a vida foi o bem precioso
Que eu adorei. Foi meu pecado...Horrendo
Seria agora que a velhice avança,
Que me sinto completo e além da sorte,
Me agarrar a esta vida fementida.
Vou fazer do meu fim minha esperança,
Oh sono, vem!...Que eu quero amar a morte
Com o mesmo engano com que amei a vida.

Mário de Andrade
(1893-1945)

Mais sobre Mário de Andrade em

Nenhum comentário: