quinta-feira, março 15, 2012
Para Ledo Ivo, o poeta deve queimar tudo o que puder, não deixar aos catadores do lixo literário nenhuma migalha. Não confiar a ninguém o seu segredo, a verdade não pode ser dita.
A queimada.
Queime tudo o que puder:
as cartas de amor
as contas telefônicas
o rol de roupas sujas
as escrituras e certidões
as inconfidências dos confrades ressentidos
a confissão interrompida
o poema erótico que ratifica a impotência
e anuncia a arterioesclerose
os recortes antigos e as fotografias amareladas.
Não deixe aos herdeiros esfaimados
nenhuma herança de papel.
Seja como os lobos: more num covil
e só mostre à canalha das ruas
os seus dentes afiados.
Viva e morra fechado como um caracol.
Diga sempre não à escória eletrônica
Destrua os poemas inacabados, os rascunhos,
as variantes e os fragmentos
que provocam o orgasmo tardio dos filólogos e escoliastas.
Não deixe aos catadores do lixo literário nenhuma migalha.
Não confie a ninguém o seu segredo.
A verdade não pode ser dita.
Ledo Ivo
(1924)
Mais sobre Ledo Ivo em
http://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%AAdo_Ivo
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário