sábado, setembro 22, 2007

A quem lhe deu carinho, a quem lhe deu cuidado, Manuel Bandeira pede compaixão. Pela ternura inquieta e malferida que ele nunca deu a ninguém.


Tu que me deste o teu carinho


Tu que me deste o teu carinho
E que me deste o teu cuidado,
Acolhe ao peito, como o ninho
Acolhe o pássaro cansado,
O meu desejo incontentado.

Há longos anos ele arqueja
Em aflitiva escuridão,
Se compassiva e benfazeja.
Dá-lhe o melhor que ele deseja:
– Teu grave e meigo coração.

Sê compassiva. Se algum dia
Te vier do pobre agravo e mágoa,
Atende à sua dor sombria:
Perdoa o mal que desvaria
E traz os olhos rasos de água.

Não te retires ofendida.
Pensa que nesse grito vem
O mal de toda a minha vida:
Ternura inquieta e malferida
Que, antes, não dei nunca a ninguém.

E foi melhor nunca a ter dado:
Em te pungindo algum espinho,
Cinge-a ao teu seio angustiado.
E sentirás o meu carinho.
E sentirás o meu cuidado.

Manuel Bandeira

(1886-1968)

Mais sobre Manuel Bandeira em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Manuel_Bandeira

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