terça-feira, setembro 23, 2008

Durante as secas do Sertão, o urubu deixa de ser livre, passa a funcionário e a acolitar os empreiteiros. Com revolta, João Cabral escreveu um poema.


O urubu mobilizado

Durante as secas do Sertão, o urubu
de urubu livre, passa a funcionário.
O urubu não retira, pois prevendo cedo
que lhe mobilizarão a técnica e o tacto,
cala os serviços prestados e diplomas,
que o enquadrariam num melhor salário,
e vai acolitar os empreiteiros da seca,
veterano, mas ainda com zelos de novato:
aviando com eutanásia o morto incerto,
ele, que no civil que o morto claro.

2.

Embora mobilizado, nesse urubu em ação
reponta logo o perfeito profissional.
No ar compenetrado, curvo e conselheiro,
no todo de guarda-chuva, na unção clerical,
Com que age, embora em posto subalterno:
ele, um convicto profissional liberal.

João Cabral de Melo Neto
(1920-1999)

Mais sobre João Cabral de Melo Neto em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Cabral_de_Melo_Neto

2 comentários:

  1. Rotina

    A idéia é a rotina do papel.
    O céu é a rotina do edifício.
    O inicio é a rotina do final.
    A escolha é a rotina do gosto.
    A rotina do espelho é o oposto.
    A rotina do perfume é a lembrança.
    O pé é a rotina da dança.
    A rotina da garganta é o rock.
    A rotina da mão é o toque.
    Julieta é a rotina do queijo.
    A rotina da boca é o desejo.
    O vento é a rotina do assobio.
    A rotina da pele é o arrepio.
    A rotina do caminho é a direção.
    A rotina do destino é a certeza.
    Toda rotina tem sua beleza.

    Arnaldo Antunes

    ResponderExcluir
  2. cARAMBA!!!
    Depois do gênio de Cabral lguém vem citar o beócio Arnaldo Antunes?
    É muita cara de pau...
    Lamntável.

    ResponderExcluir